sábado, 28 de março de 2009

Esses monstrinhos minúsculos

Andrés me ligou hoje de manhã e me perguntou se eu iria ao famigerado campeonato de bichos de estimação promovido pelos irmãos Teixeira, mais precisamente o caçula. Eu disse a ele que mais provavelmente os irmãos Teixeira não iriam querer a Sociedade Antiga dos Taurinos bisbilhotando suas coisas.

"Como assim?" A voz rouca dele soava preocupada.

"Os dois irmãos são bem rudes com os animais", eu disse, "isso não é segredo para ninguém. Você, Anderson, Bruno, Adriano, pareceram ter matado mais pela necessidade. Mas os dois matam por prazer. Daí que eles não querem que a gente vá, testemunhe mais e mais atrocidades e reforce na mente da gente a idéia de que eles são dois monstrinhos."

No final, combinei de encontrar Andrés na fazenda Taurinos. Agora era arriscado tentar raciocinar sobre os irmãos Teixeira estando tão próxima deles. Apesar de mantidos ocupados pelo torneio, nada garantia que eles não fossem perceber que suas inclinações mais perversas estavam sendo discutidas pela Sociedade Antiga dos Taurinos.

Nós discutimos o tal campeonato mais uma vez. Tentávamos entender qual seria o próximo passo de Renan. Agora se afirmava uma nova pergunta: Guilherme seguiria os passos do irmão e criaria junto com ele um sombrio mundo novo para os animais da cidade?

"Essa é difícil responder", disse Andrés abanando a cabeça, "ele parece gostar disso tanto quanto o Renan, mas a senhora sabe como o Renan é louquinho…"

Ele passou a me contar que de nós cinco, somente eu e ele não tínhamos sido convidados. Adriano recebeu telefonema de Renan pedindo que ele viesse só. Anderson e Bruno receberam o mesmo telefonema com a mesma orientação de comparecerem sós, disse ele.

"Na verdade, não é que ele não queira a Sociedade Antiga dos Taurinos assistindo como você disse, ele não quer que nós dois estejamos lá. O problema parece que é com a gente mesmo."

Eu disse que isso dava razão a ele. Fiquei pensando no que poderia ser. Porque tinha de ser desse jeito. Não que eu quisesse realmente estar presente ao evento, mais como quando eu pedi a Duílio que me levasse a uma reunião sem de fato estar nem de longe motivada a realmente ir, apenas para ver qual a reação dele seria. Andrés estava agora calado, me olhando, como se esperasse uma reação minha. Ela não veio. Qualquer coisa que eu dissesse agora seria bobagem. Certezas se desfazendo em incertezas.

"Lembra quando a senhora disse no telefone, uns dias atrás, que ele estava competindo com alguém pelo prêmio de Rei da Selvageria ou alguma coisa assim?"

"Sim, lógico."

"Então, eu acho que esses são a senhora e eu."

"E o que te leva a essa conclusão? O fato de que ele não convidou nem eu nem você para o evento dele?"

Ele ficou calado. Não pareceu achar o motivo tão convincente quando questionado.

Bruno e Anderson vieram para a Taurinos depois do campeonato. Disseram que haveria dois calangueiros improvisando no centro à noite e dois shows, um de rock e outro de música brasileira, como parte das comemorações do renascimento da cidade. Perguntaram se não queríamos ir junto. Andrés mudou de assunto bruscamente sem responder, perguntando como tinha sido o campeonato. Eles disseram que Renan estava invicto até o momento.

"Como até o momento? Não terminou hoje?" Eu estava curiosa.

"Não, está marcado para hoje e para amanhã", Bruno me olhou como se eu manifestasse um excesso incontrolável de curiosidade, "por que não foram?"

"Porque não fomos convidados."

Os três ficaram se entreolhando por uns segundos. Adriano perguntou se Renan não tinha ligado.

"Claro que não, gênio; senão ele teria nos convidado, não?", respondeu Andrés, sempre muito paciente para com o irmão.

"Mas por que ele não teria convidado vocês? Não entendo." Anderson parecia mesmo perplexo ao dizer isso.

"Vocês estavam lá com ele e eu é que sei? Faz dias que não o vejo." Andrés replicou.

Anderson explicou que não falaram com Renan em momento algum. Se ele não estava se preparando para uma batalha estava no meio de uma e não havia nele concentração para conversas com os amigos. Ele parecia determinado a vencer e pelo empenho, os resultados pareciam dar razão a ele. Ficamos ouvindo as narrativas dos embates com os detalhes nojentos e desagradáveis da natureza do próprio evento, enquanto os três conversavam. Eu olhava para Andrés e ele para mim. Definitivamente, o pequeno Teixeira começava a dar uns passos. Em que direção não sabíamos. Mas todo ele já estava em curso, em movimento. Como um navio indo a parte nenhuma. Pelo menos nenhuma que esperávamos que fosse.

Idade do consentimento | Outra geometria

Rádio Universal: Temporada Permanente

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