sábado, 25 de abril de 2009

A morte tem quatro patas

Só hoje me dispus a abrir meus e-mails. Morto não lê e-mails, mas nem todos os mortos são curiosos como eu. Agora que até mesmo Taurinos eu consegui encontrar na Internet, quem sabe vou descobrir porque meus e-mails têm andado assim às moscas nos últimos tempos. Claro que as pessoas que me escrevem imaginam que eu não poderia responder, mas com que velocidade se espalha a notícia da morte de alguém?

E-mails. De tantas datas que já nem sei quantas. A maioria, como era de de se esperar, vindos direto da caixa de saída da Meire. Dois deles me chamaram particularmente a atenção. A data de um deles era de 30/03/09. Nele, a Meire me enviava um link para uma notícia de jornal que contava de uma morte ocorrida em Santos nessa data. Um homem foi literalmente devorado por cachorros numa rua deserta do bairro da Ponta da Praia em Santos, segundo o jornal. Franzi a testa. O horário aproximado do evento me causou ainda mais estranheza. Era final de tarde. Na mensagem, ela me dizia que o tal Lopes a que a notícia se referia era um antigo vizinho meu. Demorei para atinar quem era; quando descobri, minha mente voltou ao dia em que eu retornava à fazenda Teixeira. Não consegui conter o espanto. Meire não fazia nenhum paralelo em sua mensagem. Nem poderia, porque não sabia o que eu tinha vivido. Ouvi o som de um cavalo ao longe.

Outro e-mail dela, com mais um clipping de notícias: um mecânico de São Vicente, morto em plena luz do dia com uma estiletada no estômago na Praça dos Correios, em frente ao Clube Tumiarú. A data do assassinato era do dia seguinte ao primeiro, 31/03/09. Ninguém sabe como o estilete foi parar no estômago do homem. Eu conhecia aquele mecânico. Identificado como Fernando Aita, foi o paciente com o qual trabalhei em 1994, no primeiro caso importante no qual trabalhei. Eu não conseguia acreditar. Ouvi o som do cavalo na estrada, agora mais próximo.

Para Meire, a única coisa que unia as duas mortes (e o motivo pelo qual me enviou os dois clippings) era o fato de que ela sabia que eu conhecia as duas vítimas. Eu sabia que essa não era a única ligação entre os dois. Ainda perdida nesses pensamentos, perturbada, foi que ouvi alguém bater na porta.

Eu fui atender. A outra ligação entre as duas mortes estava parada no alpendre da minha casa, me perguntando se eu não gostaria de ir com ele à Cachoeira dos Chifres. Eu disse a ele que não queria sair, ele insistiu. Não consegui disfarçar minha perturbação e ele me perguntou o que estava acontecendo. Eu disse que estava tudo bem, mas que definitivamente não queria sair. Ele argumentou que tinha vindo da fazenda Teixeira só para me convidar a ir com ele à Cachoeira dos Chifres. Eu disse que se ele tivesse usado o telefone poderia ter economizado a caminhada e o cavalo. Ele deu de ombros e se foi em seu cavalo baio, sem esconder seu desapontamento. Meu coração ainda estava batendo forte, como se eu tivesse sido visitada por um fantasma, visagem ou algo ainda pior.

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