terça-feira, 10 de março de 2009

Descendo a ladeira da memória

O ruído do osciloscópio tinha parado. Abri os olhos bem lentamente. Tudo é embaçado, mas uma coisa parece certa: não estou mais no Mithraeum e não é mais de noite. A visão leva tempo para se aclarar, mas já posso perceber que estou de volta à fazenda Taurinos. O silêncio é absurdo. É dia, mas nenhum pássaro aparece para cantar. Não ouço som algum. Estou no quarto de hóspedes onde fico, meu laptop na escrivaninha do canto como se eu nunca tivesse saído daqui. Algumas recordações me voltam muito, muito devagar. O que foi que fiz? E, mais importante, como cheguei até aqui?

Me lembro de algo agora. Eu tinha levado décadas para abrir o portão de ferro na arena. Sim, era a minha vez. Eu iria encerrar a cerimônia, sim, é isso. Eu pisei naquela lajota e o portão se abriu. Eu entrei e levei um tempão para pisar a segunda lajota, que fecharia o portão e abriria a baia do último touro. Finalmente me decidi e abri a baia. Não me lembro porque, nada aconteceu. Minto. O touro estava lá dentro, me aproximei como que para provocar o bicho e desentocar a fera para dentro da arena.

Ele pulou em cima de mim e me arremessou do outro lado do círculo. Isso mesmo. Lembro bem agora. Me lembro também neste instante que não houve impacto apreciável daquela massa de 500 quilos sobre mim, como se ela fosse uma pluma aterrissando sobre alguém que está deitado. Sim, isso era algo que me intrigava em todos os lidadores antes de mim, que eu jurei para mim mesma averiguar assim que se iniciasse o meu combate.

Então, eu estava caída e de algum modo consegui passar pela pata do touro que me prensava no chão e levantar. E o que mais? Faço um esforço para lembrar. Nada. Há um espaço vazio entre o momento em que consegui me levantar até este momento que estou vivendo agora. Me assusta pensar que esses momentos podem ter sido apagados de minha memória para me proteger.

Corro os olhos pelo quarto e vejo a porta se abrindo, lentamente, sem fazer um som. Aparentemente, Duílio colocou óleo nas dobradiças. Quando a porta se abre, tenho Duílio, Andrés e um homem que nunca vi mais gordo olhando do corredor. Andrés corre na minha direção e me derruba na cama com um abraço. Caio sem um ruído, as molas da cama não fazem ruído, a porta não faz ruído, Andrés falando comigo não…

Meu Deus. Estou surda.

Instintivamente, afastei Andrés para o lado da cama e me sentei atônita. A cabeça fervilha de pensamentos, mas mais nenhum som. O menino, o pai e o homem desconhecido me observavam incrédulos.

"Não posso ouvir vocês", eu disse com a vibração da minha voz que eu não mais conseguia ouvir, "aparentemente eu fiquei surda. Se vocês falarem devagar, talvez eu possa ler os seus lábios."

Andrés olhou para o pai com a cara típica dos que não sabem o que fazer. Deve ter sido a desgraça do osciloscópio. Só pode ter sido isso. Digo isso a ele e ele reage suspirando e sentando na borda da cama ao meu lado.

No Hospital Regional do Sul de Minas, na avenida Rui Barbosa, no centro de Varginha, fui passada por dois otorrinos que ficaram discutindo o meu caso animadamente como se estivessem num hospital universitário. Todo o tipo de exame, audiometria, toda a tranqueira disponível, raio-x do crânio. Chegaram à conclusão de que não era nada físico afetando minha audição. Nenhuma parte do sistema auditivo tinha sido lesada. Mas o mundo silencioso em minha volta me oprimia. Entendo agora os surdos e sua ocasional fúria. Na saída, reparo no relógio de parede grande que diz que hoje é terça-feira, não domingo. Não é possível.

"Sim, D. Stella, a senhora dormiu de sábado de tarde até agora de manhã. Hoje é dia 10 de março. A mãe levou café na sua cama dois dias seguidos mas não adiantou, a senhora não acordava. Hoje resolvemos chamar o médico que arranjou a consulta e os exames aqui em Varginha", Andrés não tinha previsto a minha desorientação espacial e temporal.

À tardinha, os outros Taurinos começaram a chegar para um encontro. Anderson foi o primeiro a chegar. Ele me cumprimentou com algo como "boa noite matadora" ou qualquer coisa assim que consegui ler em seus lábios. Andrés veio ter conosco e eu o vi dizer a Anderson que eu estava surda. Anderson arregalou os olhos para mim e ficou confuso por algum tempo.

"Eu estou rezando pra que volte ao normal logo", disse Andrés ao outro. O sotaque e as palavras que não uso me confundem um pouco, mas vou pegando a essência do que eles estão dizendo.

Sociedade Antiga dos Taurinos reunida esta noite. O casal titular da fazenda Taurinos foi para a cidade, já que são da Câmara Externa. Digo que foi sorte eu ter acordado no dia certo da reunião e Andrés me explica que a reunião foi chamada pelo fato de eu ter acordado. Aviso os outros que estou surda para que falem devagar. A comoção é visível e permanece por tempo indeterminado.

Os seis, na mesma ordem em que participaram da cerimônia, foram narrando seus combates na arena na madrugada de sábado, com as devidas tintas fortes da atrocidade, aquilo tudo que eu relatei ontem. Até onde me lembrava. Me pareceu que, agora que Andrés tinha terminado o seu relato, era a minha vez de contar o que se passou comigo. Mas o que se passou comigo?

Do nada, Renan se ergue da cadeira, para na minha frente e se ajoelha, como se venerando um ídolo [religioso] antigo. Estou estupefata e pergunto que nova modalidade de brincadeira social é essa.

"Ah, não é brincadeira, D. Stella. Minha vida inteira rezei pela vinda de alguém como a senhora."

"Renan, de que diabos você está falando?"

Ele franziu a testa. Os outros ficaram trocando olhares entre si, tentando entender o que estava realmente acontecendo. Adriano explicou que Renan tinha ficado fascinado ao me ver na arena e estava me venerando. Era só o que me faltava. Adriano acrescentou que não só Renan, mas todos ficaram hipnotizados com o que eu fiz na arena. Ele me conta que eles nem conseguiam gritar, o silêncio era geral enquanto eu estava dentro do círculo.

"O touro ficou machucado?", perguntei na maior inocência. A risadeira foi geral, risada de seis meninos de uma só vez.

"Digamos que um pouco triturado", Guilherme riu, tentando entrar no espírito da conversa, "em grãos finos."

Meu Deus. Estraguei o animal, então. Não senti pena dele, no entanto. Afinal, ele tinha matado um de nossos bons amigos. Do outro lado do alpendre, Anderson parece se dar conta de algo. Eu o vejo falar com Bruno e Adriano olhando para mim. Andrés parece entreouvir o que dizem.

"D. Stella, queremos ouvir a senhora contar o que se lembra da arena", diz ele, com uma fisionomia preocupada.

"Eu lembro que fiquei parada em frente ao portão, entrei e depois de um tempão pisei naquela lajota. Você sabe qual, não é?"

"Bom, e depois…?"

"Depois eu abri a baia para soltar o touro. Ele não saiu, ficou lá no fundo. Eu cheguei perto, ele pulou em cima de mim e eu me lembro que mesmo ele me prensando com a pata foi fácil sair e me levantar. Dali em diante, não me lembro mais nada."

"Num é nada disso não! A senhora tá tiran'o a gente, não é?" Renan estava ficando nervoso.

"Fica frio, Renan, ela não está lembrada agora, não deu pra ver?" Bruno ajudava.

"A senhora não lembra? A senhora veio contan'o piadas e tudo na caminhonete na volta! Como é que não lembra?"

"Eu não me lembro disso. Não me lembro nem como eu cheguei na cama."

"D. Stella, presta atenção. A senhora precisa lembrar. E contar pra gente o que aconteceu na arena. É importante, entende…" Andrés parecia ansioso, segurando na minha manga esquerda até eu pedir que parasse.

"Eu já disse a vocês o que eu me lembro", eu estava confusa com a pressão, queria ir para a cama e dormir, depois de tudo o que já tinha dormido.

"E eu já disse pra senhora que não foi nada disso que aconteceu, D. Stella" disse Renan ainda ligeiramente contrariado.

"Que é que eu posso fazer? Foi isso que eu vi. Nem podia ver as arquibancadas."

"Nenhum de nós podia. É feito de um modo que ninguém veja além do círculo, é você, a fera e mais nada. E o touro pulou para dentro da arena mas a senhora se desviou e ele deu com os chifres na proteção. Ele nunca derrubou a senhora no chão, isso não aconteceu", explicou Guilherme.

"Me parece que eu tenho seis contra uma então. Todos viram a mesma coisa?"

"Sim", respondeu o Bruno, "a gente comentou isso aqui o tempo todo depois da cerimônia."

"Renan faz dois dias que não dorme, esperando a senhora acordar pra conversar sobre o que a senhora fez", acrescentou Guilherme, enquanto Renan sacudia afirmativamente a cabeça.

Andrés e os outros olhavam para mim como quem olha para um computador quebrado no meio de um campeonato interno de videogame. Sugeri o pior para mim mesma: que eles me contassem com detalhes o que aconteceu na arena, do começo ao fim da cerimônia.

"Nós podemos fazer isso, mas se a senhora não conseguir se lembrar, não vai adiantar muito." explicou Andrés.

"Alguém pode me dizer porque é tão crucial que eu me lembre disso que vocês mesmos vão me contar? Já tenho seis testemunhas com a história verdadeira. Isso não basta?"

"Não senhora", interveio Bruno, "se a senhora não se lembra de nada do que lhe aconteceu na arena é porque nada lhe aconteceu. Se nada lhe aconteceu, a senhora não fez o que teria de ser feito. Nesse caso a cerimônia falhou como um todo e todo o trabalho que tivemos no Mithraeum não serviu para nada. A construção do Mithraeum, nada, nada do que fizemos valeu a pena fazer."

Paro para refletir. Meu Deus, havia modos de tudo dar errado nos quais nunca tinha parado para pensar. E agora aqui estou eu contemplando uma dessas muitas possibilidades. Não era o bastante que eu fizesse tudo aquilo. Eu tinha de me lembrar, aquilo tinha de ficar encravado em meu ser como a marca que Andrés aplicava em seu gado.

"Quem pode começar a contar?"

Renan tomou a palavra, "deixe que eu conte à minha mestra tudo o que ela fez; se eu estiver errado em alguma coisa vocês me corrigem, belêz?"

Ele me contou que o touro pulou em cima como todos os outros tinham feito. Eu me desviei, o touro acertou a proteção, etc. Ele diz que eu apanhei o touro pelo rabo e girei o animal que foi acertando todos os postes de fixação da grade com a cara enorme que foi aos poucos se desfazendo em sangue e dentes quebrados [palavras dele].

"Foi do caralho, D. Stella", ajuntou Adriano.

"Muito, muito irado", comentou Guilherme para o sorrisinho maroto de Anderson, bem ao lado dele.

"Então, você pegou a espada que estava no chão no meio da sangueira e das tripas e enfiou nele com tanta força que saiu do outro lado. Foi lindo ver ele sangrando de dois rombos ao mesmo tempo."

"Espera… Você disse que eu peguei a espada do chão. Eu me lembro disso."

Todos se entreolharam e começaram a sorrir de orelha a orelha.

"Puta merda, ela 'tá lembran'o", Andrés estava a ponto de explodir de felicidade.

"Quero dizer, eu me lembro de que ela tinha caído no chão quando ele pulou em cima de mim. Me lembro que eu pensei na espada na hora e que ela tinha caído fora do alcance, ainda por cima no meio daquele monte de tranqueira que estava na arena."

"Na verdade, já é algo de que a senhora se lembrou", insistiu Andrés, "vamos ver o que mais vem na sua lembrança."

Renan continuou a narração. Ele contou que eu tinha aplicado a técnica dele de girar o copo da espada em círculos para alargar cada vez mais os ferimentos no corpo do animal e disse ter ficado muito orgulhoso de eu ter adotado sua técnica. Mas a violência com que eu fiz o movimento foi o que o impressionou mais do que tudo naquele momento. Eu estava horrorizada em ser o guru dele. Definitivamente algo que nunca me passou pela cabeça.

"Com certeza foi o próprio Mitra quem mandou a senhora. Eu nunca vi nada parecido, D. Stella. O que faz a senhora tão feroz? O que que eu tenho que fazer pra chegar aonde a senhora chegou?"

"Adoraria poder te dizer. Mas eu não sei nem o que eu fiz, quanto mais saber como eu fiz."

"Conta mais, Renan; vê se vai refrescando a memória dela", pediu Andrés.

Renan agora me contava como arranquei o couro do animal dos pés à cabeça. O sofrimento para o touro, ele acrescentou, foi inimaginável sem a proteção do couro que arranquei. E a espada furou o animal em sua própria carne, já que não havia mais couro para protegê-la da minha fúria infernal.

"Foi delicioso ver o bicho completamente à mercê das suas espadadas. Eu chorava de felicidade. Ele finalmente 'tava receben'o o castigo que ele merecia, nem mais, nem menos. Eu curti cada um dos mugidos dele e cada segundo do sofrimento dele. Quem dera eu pudesse estar lá com a senhora. Quem dera eu fosse a senhora. Pela primeira vez na minha vida eu senti que ser uma mulher não ia me importar."

"Renan, a gente sabe o quanto você ainda está chocado, mas não exagera, vai" ponderou Anderson debaixo de uma chuva de risos que incluiu o próprio Renan e eu.

"Continua, Renan", espetou Andrés.

"Continua o que? Quer que eu conte as quatro horas todas?"

"Quatro horas? Eu fiquei fazendo isso tudo quatro horas?"

"Sim, senhora entrou na arena eram oito e quinze. Ao meio-dia e quinze nós seis descemos e fomos tirar a senhora de lá. Estava deitada no meio daquela bagunça de ossos, pele, chifres, sangue e tripas, ainda dividindo o bicho em pedaços bem pequititicos com as mãos." contou Renan.

Meus Deus. Quatro horas extremas de minha vida que eu simplesmente decidi apagar de minha memória. Ou que ela apagou de si mesma, já nem sei mais. Pra onde foi tudo o que eu fiz? Será que se foi para o infinito, como o texto que a gente digita por horas sem salvar e um pau no computador sem mais nem menos o apaga para sempre?

"Bom, a senhora se lembra de mais alguma coisa?", perguntou Andrés.

"Como eu já lhe disse, só aquilo que eu já lhe disse."

"A senhora não pode ter esquecido, D. Stella! Pelo amor de Deus, não diz isso pra gente não! Como a senhora pode ter esquecido da gente voltan'o, nós conversamos sem parar no carro, não é possível, porra!" Adriano estava quase chorando e estava para se levantar, quando Andrés o puxou de volta para a cadeira. Momentos de tensão sobrevoam o alpendre como morcegos vampiros, esperando a chance de atacar.

"Calma, Adriano. Desespero não vai adiantar nada. Nós fracassamos. A não ser que ela se lembre do que aconteceu na arena, a Sociedade fracassou. O mais difícil fizemos. E ela fez o mais difícil de tudo. Agora não se lembra, e não há nada que a gente possa fazer. Como a gente pode obrigar alguém a se lembrar de alguma coisa? Nós contamos quase tudo a ela, pelo menos o que era mais importante, e se mesmo assim ela não lembrou, só nos resta esperar. Até que ela se lembre ou até que a gente perceba que tudo o que nós fizemos não valeu de nada. É triste, mas é isso, irmãos." Andrés terminou de falar, tirou os óculos e enxugou os olhos úmidos com as costas da mão.

Renan, Adriano e Guilherme estavam chorando. Começo a sentir vontade de chorar também. Por tempos, fomos uma equipe, com suas contradições, divergências, mas uma equipe unida. Tencionávamos salvar a cidade. Eu estivera presa à concepção de que se tivéssemos feito o que tínhamos que fazer tudo estaria resolvido. Eles afirmavam que a cerimônia tinha corrido exatamente como planejado. Sendo assim, deveria funcionar. Mas vejo agora que a questão não era tão simples assim. Como é que a gente chegou nisso?

"Não acredito, não acredito, todo o trabalho que nós fizemos… O santuário, a pintura, a construção, me preparan'o desde o ano passado pra cerimônia… E nós fazen'o tudo certinho dentro do santuário, até D. Stella que acabou superando todo mundo. E pra que, caralho? Mente pra mim, D. Stella; me diz que a gente não está esse tempo todo fazen'o tudo o que a gente fez pra tudo acabar nessa coisinha triste." Adriano estava indignado, possuído por alguma louca e explosiva mistura de raiva, desespero e tristeza.

"Agora chega, Adriano", interveio Andrés, "e vocês todos agora me escutem também. Querem um bode expiatório? Estou aqui. A culpa é toda minha se nós falhamos. Fui eu quem iniciou D. Stella na Sociedade. Vocês sabem bem que ela nem sabia porque eu estava pedindo a ela pra assinar o nome inteiro dela no dia da fundação da Sociedade Antiga dos Taurinos, embaixo do nome do Renan. Eu nunca disse a ela que teria de fazer por qualquer um de nós que por algum bom motivo não conseguisse chegar à cerimônia. E a desgraça aconteceu com nosso irmão Arthur. Eu a iniciei porque achei que como ela "via" poderia ajudar em muito dentro da Sociedade e vocês mesmos viram o quanto ela foi corajosa dentro da arena. Quem poderia prever que nosso irmão iria ter esse fim horrível? Quem poderia prever que D. Stella fosse perder a memória da hora em que entrou na arena até a hora em que foi dormir? Eu estava totalmente errado quando a iniciei. Maldito seja o dia em que fiz isso. Maldito seja o desgraçado animal que matou nosso amigo. Mas usar isso pra fugir da minha responsabilidade, eu não uso. Eu sou homem e tenho a minha palavra. Estou pronto pra aceitar qualquer punição que a Sociedade ache que eu mereça. E quando eu digo "qualquer" é isso mesmo que eu quero dizer, meus irmãos."

Eu disse a eles que falassem mais na minha frente ou eu não poderia ler os lábios deles. Mas entendi um pouco do que tinha sido dito por Andrés e tratei de desencorajar esse negócio de corte marcial.

"Essa não é sua escolha sozinha, D. Stella", me disse Andrés, rosto molhado e fungando, "é a maioria da Sociedade quem decide isso. Se vai haver um julgamento, a Sociedade inteira tem que se manifestar."

"Como, se vai haver um julgamento? Vai sim. Eu não fiquei me fodendo esse tempo todo pra chegar numa coisa assim. Eu sempre disse que era contra ela ter participado. Adriano não queria; Arthur mesmo não queria que ela participasse, lembram? Alguma coisa deve ter dado errado por ter sido uma mulher." disse Bruno, seguido por Adriano.

Agora o chauvinismo de Bruno e Adriano retorna com força total. Se na visão deles consegui fazer ainda pior do que seis homens fizeram, então o problema tem que estar no depois. Em algum ponto tem que falhar, lógico, afinal sou apenas uma mulher. Anderson concordou que tinha de haver um julgamento de Andrés. Guilherme e Renan também. Eles pediram que Andrés saísse. As coisas estão ficando mais feias por aqui.

"Eu voto por não haver julgamento", fui logo declarando assim que vimos Andrés sumir de vista.

"Pois eu digo que sim e os outros também, então seu voto é voto vencido", respondeu Adriano rispidamente. Anderson foi brando, mas confirmou o julgamento. Renan fez o mesmo, a expressão derrotada no rosto. Guilherme e Bruno (esse nem se precisa dizer) disseram sim ao julgamento. Perguntei a eles quando seria o julgamento. Me responderam que já estava acontecendo. Perguntei como podiam julgar alguém sem que ele estivesse presente. Me responderam então que Andrés já sabia o que tinha feito, já conhecia as opiniões deles e já sabia que tipo de punição era merecida em casos como o dele próprio. Diante do meu total espanto, chamaram Andrés de volta ao alpendre.

"Chegamos a uma decisão, Andrés. D. Stella tem um dia para cada um de nós lidadores para conseguir se lembrar do que aconteceu com ela na arena. Se ela não conseguir, você vai se afogar na Cachoeira dos Chifres." Adriano declarou, falando pelo grupo.

"Ele não está falando por mim, Andrés, pode acreditar."

"Ah, estou sim, estou falando pela senhora também. A senhora é membro dessa Sociedade, tem que acatar o que foi decidido. O que a Sociedade decidir é sua decisão também. Vence a maioria e a maioria decidiu assim." Adriano ficou indignado e agressivo ao me responder.

"Eu agradeço a defesa, D. Stella, mas eu acato de boa vontade o que foi decidido pelos irmãos. Vocês têm todo o direito de me condenar. Eu reuni os amigos aqui hoje para relembrar o que fizemos e comemorar a nossa vitória. Não esperava jamais que isso fosse terminar assim. Mas não tenho escolha a não ser aceitar o que veio no lugar da comemoração. Minha vida, a sua, a deles e a da cidade estão nas suas mãos agora."

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